Falar com meus entes queridos , me traz o passado de volta e prá variar, faço minhas viagens no tempo e me deparo com coisas que estavam adormecidas na minha caixinha de lembranças. A minha caixinha é mágica, onde guardo minhas jóias e essas, com certeza ladrão nenhum vai me tirar e até posso levá-la na minha bagagem de volta.
Hoje, vou entrar de novo na casa da nossa infância, lá no mundo de sonhos da Usina Trapiche. Aliás, tenho que dizer que não são apenas lembranças do tempo em que éramos crianças. Tem muita coisa boa a lembrar do tempo em que já adultos , íamos passar o final de semana com nossos velhos queridos. Eles ficavam na maior ansiedade ,esperando a nossa visita e era muito gostoso. Chegávamos com todas as nossas tralhas, bagunçávamos a casa toda arrumadinha, a nos esperar e era uma farra.
Na minha mente, é como se eu estivesse chegando... os dois , Seu Abel e Dona Graça , no portão, ela sempre muito arrumadinha, cheirando a “Rastro”, sua colônia usual, cheia de alegria, meio trêmula e excitada , me abraçando com aquele abraço de saudade, que sinto até hoje. Ele, feliz com a nossa chegada, desfazendo seu ar sisudo e nos recebendo com um sorriso e festejando a chegada, digamos de passagem, principalmente dos netos.
Eu olhava a casa, aquela entrada , o portão verde de ferro , o jardim bem cuidado, a varanda cheia de cestas que eram habilmente forradas de cascas de coco, com lindas samambaias viçosas . A trepadeira “ mimo do céu” toda cheia de flores cor de rosa, o mimo de mamãe, que ela gostava tanto e que como se a homenageasse, se esparramava , tomando conta de parte da varanda. Eu observava tudo e era como se quisesse guardar na alma , aquele quadro, aquele lugar que era meu refúgio e minha verdadeira casa. Alí , era um lar de verdade e cada vez que eu chegava , era como se voltasse para o útero da minha mãe e me sentisse protegida.
Chegávamos todos em bando, uns já casados , outros com seus futuros companheiros e nessa época só os netos mais velhos. Éramos sempre bem vindos e acolhidos com o mesmo entusiasmo.
As acomodações eram feitas , os assuntos postos em dia e a farra começava. À noite , a jogatina era sagrada. Todos se reuniam em volta da mesa para o jogo de buraco que ia até o dia amanhecer. Papai já não fumava nem bebia mas todos faziam fumaça e consumiam todas as cervejas da geladeira. Não sei como mamãe suportava aquele “fumacê”. Nem sempre o jogo era tranqüilo, pois sempre tinha um que não sabia perder e os que trapaceavam, mas era muito divertido. Eu, como sempre, era escalada só quando faltava parceiro. Nunca fui muito de jogar e ninguém queria jogar comigo, porque além de não prestar muita atenção no jogo, eu pegava tudo que tinha na mesa e demorava muito prá descartar.
Na manhã seguinte , o dia começava tarde com café da manhã , ovinho frito na manteiga pela Dona Graça e mais aquele monte de coisas gostosas que ela fazia. Todos se deliciavam e iam curtir a preguiça da noite mal dormida. Ninguém se preocupava muito em por as coisas em ordem e era uma trabalheira para mamãe, que nunca reclamou de nada.
As crianças nos divertiam com suas gracinhas e era uma festa. Lembro de uma vez que estávamos na varanda e nessa época , Luiza ainda não era casada e tinha ido com Sergio passar o final de semana. Sergio já era Capitão e muito cheio de cerimônias. Silvia era pequena e adorava ele. Ele estava com ela no colo e de repente, a pequena começou a pegar nos botões de sua camisa e foi de cima prá baixo perguntando : o que é isso ? -“ É um botão” , respondia ele. – E isso ? E isso? - Ele respondia a mesma coisa: “ é um botão”. E assim , ela continuou até o último . Quando acabaram os botões , ela foi descendo a mão e perguntando a mesma coisa. Sergio, ficou sem graça, não soube o que responder, ficou vermelho que nem um pimentão e nós rimos muito do seu embaraço!
A Flávia era altamente compenetrada com o missal de mamãe e ficava um tempão como se estivesse lendo, coisa que ainda não sabia. Em uma ocasião Tia Ção ( irmã de papai) de passagem pela usina, viu aquilo e ficou impressionada. Saiu e comprou umas revistinhas infantis porque achou que era um absurdo, aquela criança está tentando ler um livro de orações. Outra da Flávia, era encher de bolinhas um caderno, que à primeira vista, parecia uma escrita. Todo mundo se divertia com o comportamento intelectual dela.
Valerinho parecia o” Pequeno Príncipe” e sua arte era mexer na torneira do jardim e tomar banhos incríveis. Ele e o Marcio eram grandes companheiros e gostavam de se meter em confusão. Ainda tinha o Vic, o pior de todos. Esse era o mais arteiro e na hora do almoço deles, que mamãe fazia questão de preparar e acompanhar, Vic era o mais guloso e apressado, deixando a vovó toda atrapalhada , mas com certeza feliz.
Bons tempos! Tanta coisa aconteceu nesses nossos encontros na usina e tanta coisa mudou com o tempo, mas vale à pena recordar e passar para os nossos filhos e netos o que vivemos no “século passado”. A vida pode ter tirado algumas coisas de nós, mas nos deu e continua dando outras, na sua sequência inevitável de dias e anos e na sucessão familiar. O meu saudosismo é muito maior que os dissabores e eu me sinto feliz em estar aqui contando minhas histórias que são de todos nós Paurá Peres, parentes e aderentes !!!
Graça,abril/2012
Mãe, eu adorei é como se eu estivesse vendo aqueles dias na Usina, mas tenho que fazer um comentário, quem era alucinado pela torneira do jardim era Vic, isso pq aquela torneira tinha uma pressão danada e qdo a gente abria fazia um estrago.....era MARAVILHOSO!!!!!!
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